Diário poético de Viña del Mar




06.11.11 - Domingo

Estrangeiros

Meus pés tocam outra terra
Que tem um verde não comum
Onde o que brilha não é ouro

Ainda que o azul esteja presente
Os proclames são diferentes:
Desconheço suas leis, seus tesouros.

Aos poucos, meus olhos são brindados
Como com vinhos arroxeados,
E me embriago do novo ar que respiro.

Seus ventos me sopram os desejos
De saborear tudo que me revela:
Seus relevos pintados na tela em que me vejo

Pela janela já vislumbro:
Que vou me colorir de novas cores, novos amores...
E ser banhada por outro mar.

Tenho mais gana de te descobrir e te desbravar
Porque sei que não sou daqui, e,
No fim das contas, me dou conta, que não vim pra ficar.



07.11.11 - Lunes

As mesmas flores

Quando vejo que todas as casas possuem um jardim
Grande ou pequeno: margaridas, violetas, jasmins...
Compreendo em cada canto, um encanto,
Como se todos os cantos fossem um só.
As cercas ainda cercam,
Mas as flores espalham seu odor.
São essas mesmas flores
Que extrapolam as fronteiras,
Inspirando a fé na ausência das barreiras
E a esperança de, um dia, com sorriso e suor,
Em todos os cantos ensaiar
A inquietude de crer e a força de sonhar
O sonho de cantar um mundo melhor

Por causa das flores...


08.11.11 - Martes

A fogueira

Cata lenha
Junta lenha
Faz fogueira
Esquenta as mãos

E a noite, num feixe de luz
Numa faísca de calor
Num copo de vinho
Ganha vida e vence o frio

Cata gente
Junta gente
Joga na fogueira
Aquece o coração

E a noite, num feixe de luz
Numa faísca de calor
Num copo de vinho
Se faz vida e lembrança de amor.



09.11.11 - Miercoles

Estreia

As luzes da cidade
Acendem lindamente
- 1 minuto para começar!
Lá fora o frio arde
E no corpo a gente sente:

O barulho dos passos
De cada pessoa que entra
O abrir da cortina
O espaço da cena
E a luz do palco, ilumina

Borboletas a revirar o estômago
Por de trás das coxias
Uma alerta:
E o mundo paralelo, nosso elo,
Se faz verdade e fantasia

Se a vida fosse estreia
Todo dia seria:
Perceptível
Sensível
Audível
Respirado
Amado,
E, no fim,
Aplaudido!



10.11.11 - Jueves

A Feira

Morgango, Amora
Cereja, Mandarina
Olha o peixe, Alcachofra
Sapato, roupa, Aspirina
Tem de tudo na feira
Nós trouxemos alegria
Leva, leva minha gente
Na sacola do dia:
Encontro Achupalla
Vamos entoar:
Nosso choro é buá
A risada Rá rá
E o canto lálá
Que viva o teatro
Teatro popular
E vem dançar Ciranda
Que é de Itamaracá
É de graça, não paga
Vamo aproveitar:
Morango, pandeiro
Cereja, violão
O peixe, a garganta
Sapato, emoção
É feira, é teatro
Brincantes na rua
É Chile, é Brasil
Em Viña del Mar
Inda tem carnaval
Pra gente pular.
É a arte da vida
Abrindo o sorriso
Brilhando o olhar
Na rua, na feira,
Não existe fronteira
Se vai conjugar
O verbo da vida
A arte de amar.



11.11.11 - Viernes

Valparaíso

Acordei em Valparaíso
Mira: que o paraíso está!
Entre morros e colinas
De frente para o Mar

No ar que se respira
Nas cores que posso ver
Nas histórias que me contam
O teu porto, o amanhecer.

Cada beco, cada casa
Muro, ponte, praça
Teus segredos escancarados
Nas cores que nos conquista

Na poesia dos filhos
Que de sua terra gentil
Nos faz versos de seus versos
E nos contagiam de amor febril



12.11.11 - Sábado

Os segredos de Chiloé

Num piscar de olhos
Não sei onde estou:
No fundo do mar?
Nos braços de um bruxo?
Nas redes de um pescador?

Há de se castigar
Quem maltrata a terra
Há de se regalar
Quem protege o mar
A voz do vento do sul vem avisar

Há de se respeitar
As crenças
As diferenças
As reticências
Aquilo que não se vê

Há de se enxergar beleza
De entender o que se é
Há de se encontrar na natureza
Histórias de sabedoria
Da gente de Chiloé



13.11.11 - Domingo

Todos juntos

E uma canção chilena vem nos dizer:
“Se vivemos todos separados,
Para que servem o céu e o mar?” *
Que terras são as nossas?
O que mesmo pode nos separar?

É um mesmo sol que nos ilumina
São as estrelas que nos guiam
Pelos caminhos desta América
Peruana, brasileira, Chilena, Latina!

A língua que falamos é uma só:
Uma só é a arte que nos une pela causa
Tantos sonhos e canções compartilhadas
Como não nos sentirmos em casa?

Feliz encontro, irmãos de América,
- ‘Eternamente responsáveis’! **
Pelo compromisso plantado
De fazer um mundo melhor

Caminhamos lado a lado...
Se justiça é o que queremos, vamos fazer:
“Se este mundo é um e para todos,
Todos juntos devemos viver”! ***

* Trecho da música Todos Juntos (Los Jaivas)
** Trecho do livro O Pequeno Príncipe (Saint-Exupéry)
*** Trecho da música Todos Juntos (Los Jaivas)

14.11.11 - Lunes



Venceremos

Somos o lugar onde nascemos
Somos as escolhas que fazemos
Somos aquilo que acreditamos
Ser

Somos os lugares que visitamos
Somos o que deixamos acontecer
Somos aquilo que desejamos
Fazer

Somos a história de nosso povo
Somos o povo e a história
Somos latino-américa:
Resistência e memória.

Um povo que caminha
No solo banhado pelo sangue
Dos que morreram e ainda morrem
Com urgência

Pelos sonhos de liberdade
Para ver a irmandade
Superar toda a demência
Que oprime

Aos que dizem que somos menos
Que fazemos menos, que não temos...
A nossa resposta estamos construindo:
Unidos, venceremos!



15.11.11 - Miercoles

De volta pra casa...

Malas prontas
Para a partida
Nós que chegamos estrangeiros
Voltamos para casa
Deixando um novo lar
Um pedaço de nossas vidas
Divididas entre partir e ficar
Entre cultivar e colher
E comer do fruto
Que fizemos crescer

Na nossa bagagem:
A grande lição
De amor e coragem
De acreditar e fazer
O sonho acontecer.

Há de se ter coragem para viver!
Para chegar, partir e (...) voltar...
Para destruir e reconstruir
Para fazer de cada chegada o fim
E, de cada fim, um novo começar.